10 jul No meio do caminho tinha uma pedra…
“No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho…”
Tanto na vida como na poesia (mas poesia não é vida?), as “pedras”, ou seja, os obstáculos surgem. O poeta Carlos Drummond de Andrade, nos versos deste mesmo poema, continua: “nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas.”
Retinas fatigadas, ou seja, olhos cansados, corpo e mente também, e eis que, depois de instalar um cabo de alta tensão, você descobre durante o teste de capa (previsto na IEC 60.229) que a capa externa está danificada e que será necessário localizar e reparar o dano. Porém, o cabo de alta tensão está instalado dentro de eletrodutos preenchidos por bentonita e, acima de tudo, existe ainda uma camada larga de concreto. O que fazer nessa situação?
As referências técnicas para realizar este tipo de trabalho são o guia do IEEE 1.234 e a Brochura Técnica do Cigre nº 773.
Mas antes de seguirmos para a prática, é importante entender que a técnica de localização de falhas em cabos isolados de média, alta e extra alta tensão, e isso inclui também as falhas nas capas externas, é realizada em duas etapas principais e outras de apoio, sendo a que primeira etapa é a mais importante e a mais crítica, que consiste em fazer a pré-localização, enquanto a segunda etapa determina a localização exata da falha. A pré-localização pode ser realizada através do método de reflectometria ou de pontes, e para a localização exata os métodos acústico e de tensão de passo são os recomendados.
Para falhas em capas, o método ponte é o mais indicado para a fase de pré-localização, enquanto o método de tensão de passo é o indicado para a localização exata.
Dito isto, podemos resumir o trabalho de localização de falhas em capas de cabos isolados da seguinte maneira:
Primeira etapa: pré-localização – método ponte
O procedimento do método consiste no balanceamento da ponte, ou seja, a tensão é
aplicada aos terminais e o equipamento realiza o ajuste de resistores internos variáveis, R1 e R2, de modo que a corrente no galvanômetro G seja nula. Aplicando as Leis de Kirchhoff ao circuito equivalente e considerando uma resistência uniforme ao longo de cada um dos condutores, a posição da falha é determinada. Os cálculos são realizados automaticamente pelos firmwares dos equipamentos.
É importante destacar que, para aplicação do método, cabos auxiliares, fases irmãs ou blindagens devem estar intactos para a composição do laço, que é o arranjo de teste. A precisão dos testes pode alcançar até 1%, mas falhas de alta impedância são de difícil localização pelo método, pois as correntes envolvidas no circuito da ponte se tornam muito pequenas e isso pode impactar de forma significativa na precisão dos resultados.
Figura 1.
A montagem do equipamento pode ser descrita conforme a figura abaixo:
Figura 2.
Nesse método, é necessário ter um cabo adicional de mesmas características construtivas, seção e comprimento para realizar o retorno da corrente de medição da ponte. Dessa forma, como o circuito a ser localizado contém 1 cabo com a capa com ponto de falta e as outras duas fases sem defeitos, serão utilizadas as blindagens das outras fases para o fechar o loop, conforme a figura acima.
Segunda etapa: localização exata – método de tensão de passo
Finalizando a primeira etapa, passamos então para a fase seguinte, que consiste na localização exata da falha.
Tensão de passo
Um gerador de ondas quadradas aplica um nível de tensão suficiente para causar a falta no local do defeito, que fora pré-localizado previamente.
Figura 3.
Com um instrumento adicional (PROTRAC + SVP), geram-se pulsos que indicam a direção com maior intensidade do sinal da tensão de passo e, seguindo o traçado, é possível localizar o ponto exato da falha.
Figura 4.
Figura 5.
Você pode notar, na figura 4, que para a técnica de tensão de passo funcionar é necessário que não existam obstáculos que impeçam o campo elétrico gerado pela falha de se propagar. Logo, quando o cabo está envolvido com bentonita e dentro de um duto, ou seja, quando há uma “pedra no meio do caminho”, a única maneira de se localizar o local exato é abrindo pontos no eletroduto corrugado para conseguir inserir as hastes de medição. No meio do caminho tinha uma pedra e você tirou a pedra, localizou, reparou e ligou o circuito!
Autor:
Por Daniel Bento, engenheiro eletricista com MBA em Finanças e certificação internacional em gerenciamento de projetos (PMP®). É membro do Cigré, onde representa o Brasil em dois grupos de trabalho sobre cabos isolados. Atua há mais de 25 anos com redes isoladas, tendo sido o responsável técnico por toda a rede de distribuição subterrânea da cidade de São Paulo. É diretor executivo da Baur do Brasil | www.baurdobrasil.com.br
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Fonte: www.osetoreletrico.com.br