Considerações para a utilização de centelhadores como DPSs tipo I ou I +II

Considerações para a utilização de centelhadores como DPSs tipo I ou I +II

Dispositivos de proteção contra surtos

A utilização de Dispositivos de Proteção contra Surtos (DPS) para a proteção das instalações elétricas e seus equipamentos eletroeletrônicos já é parte da realidade dos nossos engenheiros eletricistas e técnicos em eletricidade. Como, onde e porque instalar os DPSs constam das normas técnicas ABNT NBR 5410:2004/2008 – Instalações elétricas de baixa tensão, e ABNT NBR 5419:2015 – Proteção contra descargas atmosféricas. Os dispositivos de proteção contra surtos em si estão normalizados na norma técnica ABNT NBR IEC 61643-1:2007 – Dispositivos de proteção contra surtos em baixa tensão – Parte 1: Dispositivos de proteção conectados a sistemas de distribuição de energia de baixa tensão – Requisitos de desempenho e métodos de ensaio. Mas, neste caso, é necessário recorrer a outras normas IEC da série 61643 a fim de se conhecer mais sobre as características dos DPSs.

Os DPSs se dividem em protetores para energia e sinal, sendo que, no primeiro caso, eles ainda são subdivididos nos tipos, ou classes, de proteção, I, II e III. Uma combinação de critérios técnicos e econômicos levou à seguinte utilização de três componentes não lineares para a fabricação dos DPSs:

  • Centelhadores para fabricação de DPSs tipo I;
  • Varistores para fabricação de DPSs tipos I+II e II;
  • Diodos para fabricação de DPSs tipo III.

 

Novos conceitos em DPSs

O desenvolvimento tecnológico, a concorrência e o aumento do conhecimento sobre a proteção contra surtos têm motivado os fabricantes de DPSs a oferecer novas soluções para que os projetistas possam especificar protetores de surtos mais eficazes e econômicos, tornando as instalações elétricas cada vez mais protegidas contra os surtos de tensão. Entre estas novas tendências, embora já muito empregadas em outros países, destacam-se a utilização de centelhadores como DPSs tipo I+II e varistores como DPSs tipo I. Para que não se tornem profissionais presos a conceitos ultrapassados e acabem fora do mercado, é fundamental que quem trabalha na área elétrica aprofunde seus conhecimentos sobre as principais características que diferenciam centelhadores e varistores, para que tirem o máximo proveito das vantagens existentes em cada um destes componentes.

Como engenharia não é ciência, a primeira questão envolvendo a opção entre centelhadores [4] e varistores é econômica. Centelhadores não se degradam com o uso e possuem uma vida útil praticamente ilimitada. Entretanto, o custo de um varistor, quando comparado a um centelhador com os mesmos valores de corrente de surto e nível de proteção, é bem inferior [5]. Neste caso, caberia ao projetista analisar junto com o seu cliente qual a melhor opção. Comprar um varistor, cujo preço seria menor, ou um centelhador que custaria mais, mas não necessitaria ser substituído durante o período de operação do empreendimento, proporcionando um menor custo de ciclo de vida, além de maior confiabilidade para a instalação elétrica.

 

Novas tecnologias para os centelhadores

Em relação aos centelhadores, a maior objeção à sua utilização sempre foram as suas características curto-circuitantes, o que levou os fabricantes de DPSs a grandes investimentos em pesquisa para evitar que correntes de curto-circuito ou em regime permanente passassem através do DPS para o sistema de aterramento, após a condução da corrente de surto.

Podemos denominar os DPSs tipo I de descarregadores de corrente de raios, para diferenciá-los dos protetores contra sobretensões, DPSs tipo II. Dessa forma, fica claro que os requisitos de tempo de condução e energia específica que um DPS tipo I deve atender serão os mais altos possíveis, além de ele ter que conduzir e posteriormente interromper correntes de curto-circuito ou em regime permanente, chamadas de correntes de seguimento, após a passagem da corrente de surto.

Os primeiros centelhadores eram apenas eletrodos separados por uma distância específica, que determinava o valor de tensão em seus terminais, para o qual ele deveria começar a conduzir. Como esta configuração rudimentar não era capaz de interromper as correntes de seguimento, os fabricantes de DPSs investiram no desenvolvimento de novas tecnologias para que os centelhadores, além de conduzir as correntes de surto, pudessem, por suas próprias características, interromper estas correntes de seguimento.

A primeira solução para interrupção das correntes de seguimento foi a modificação do formato dos eletrodos para aumentar a distância percorrida pelas correntes entre os eletrodos, facilitando a extinção das correntes de surto e de seguimento. Isto permitiu que fosse possível extinguir as correntes de curto-circuito, até certo valor, e em regime permanente, evitando que a atuação dos centelhadores levasse à abertura dos fusíveis e disjuntores a montante (Figura 1), tornando muito mais confiáveis as instalações elétricas protegidas pelos centelhadores com eletrodos modificados.

FIG01-DICAS

Figura 1 – Atuação do DPS não deve provocar a abertura dos fusíveis ou disjuntores a montante.

Encontrada esta primeira solução, satisfatória para o problema das correntes de seguimento, o passo seguinte foi, além de aperfeiçoá-la, tentar reduzir o valor do nível de proteção obtido por estes centelhadores. Para isso foi empregada uma segunda tecnologia utilizando centelhadores com placas de carbono, em que elas substituiriam o ar como dielétrico, para que existissem vários, e não apenas um, centelhamentos entre os eletrodos, o que reduziria a energia da corrente de curto-circuito entre as placas, tornando a extinção das correntes de curto-circuito muito mais fácil. Como benefício colateral, os centelhadores com placas de carbono permitiram a redução do nível de proteção para valores iguais, ou abaixo, de 2 KV, alcançando, pela primeira vez, níveis de proteção semelhantes aos varistores, o que possibilitou a instalação de centelhadores e varistores em um mesmo painel, sem a utilização de bobinas ou determinado comprimento de cabos entre eles.

Uma outra tecnologia para melhorar ainda mais a eficiência dos centelhadores na interrupção das correntes de seguimento e coordenação com os equipamentos protegidos utilizou um mecanismo de disparo para gerar uma tensão oposta e de valor similar a tensão da rede, limitando a corrente de seguimento conduzida pelo centelhador a um valor mínimo, independentemente do nível da corrente de curto-circuito da rede. Esta tecnologia, patenteada com o nome de Radax-Flow® (Figura 2), permitiu a utilização de centelhadores nos quadros de entrada, mesmo em instalações com alto nível de curto-circuito.

Fig02-Dicas

Figura 2 – Interior de um DPS utilizando a tecnologia Radax Flow®.

 Utilização de DPSs antes dos medidores de energia

Uma aplicação em que deveria ser feita uma análise cuidadosa de qual tecnologia utilizar é a instalação de DPSs antes dos medidores de energia. Embora por razões de padronização, as concessionárias que permitem a instalação de DPSs antes de seus medidores não façam distinção entre centelhadores e varistores, o fato de se degradarem com o uso torna inevitável, após algum tempo, a substituição dos varistores, com todos os inconvenientes associados. Caso fossem instalados centelhadores, tais substituições não aconteceriam, o que representaria uma enorme economia para a sociedade.

 

Conclusão

Devido ao seu menor preço, os varistores estão sendo utilizados como DPSs tipo I ou I +II, onde centelhadores deveriam ser instalados, permitindo um menor custo de ciclo de vida das instalações, maior confiabilidade e melhor coordenação energética entre os diversos níveis de proteção e os equipamentos protegidos. Cabe ao projetista da instalação aprofundar os seus conhecimentos sobre as características dos centelhadores e varistores para que o melhor DPS seja utilizado, assegurando que a proteção contra surtos seja a mais eficaz e eficiente possível.


Referências

1 – ABNT NBR 5410:2004; Versão corrigida:2008, Instalações elétricas de baixa tensão.

2 – ABNT NBR5419-1/2/3/4:2015: Proteção contra descargas atmosféricas.

Parte 1: Princípios gerais.

Parte 2: Gerenciamento de risco.

Parte 3: Danos físicos a estruturas e perigos à vida.

Parte 4: Sistemas elétricos e eletrônicos internos na estrutura.

3 – ABNT NBR IEC 61643-1:2007: Dispositivos de proteção contra surtos em baixa tensão. Parte 1: Dispositivos de proteção conectados a sistemas de distribuição de energia de baixa tensão – Requisitos de desempenho e métodos de ensaio.

4- Neste artigo os termos centelhador e varistor serão utilizados para se referir a DPS fabricados com respectivamente centelhadores ou varistores como único componente não linear.

5- SANTOS, Sergio Roberto Silva. Estudo da relação entre o valor de venda e a qualidade percebida: uma aplicação aos dispositivos de proteção contra surtos. Trabalho de conclusão de curso apresentado ao centro de Ciências e Tecnologias para a Sustentabilidade da Universidade Federal de São Carlos, campus Sorocaba, para obtenção do título de Especialista em Economia & Negócios. Sorocaba, São Paulo. 2017.

 

*Sergio Roberto Santos é engenheiro eletricista da Lambda Consultoria.

 

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Fonte: www.osetoreletrico.com.br