20 jan Materiais para sistemas de aterramento: dimensionamento de condutores
A eficiência e a confiabilidade de operação de um sistema de aterramento e de proteção contra descargas atmosféricas estão diretamente ligadas não somente a um bom projeto, mas também à correta especificação de materiais que assegurem a qualidade da instalação. A utilização de materiais inadequados ou que não cumpram com as exigências técnicas das normas pertinentes pode colocar em risco o sistema de proteção.
A norma brasileira ABNT-NBR-16254 – Materiais para sistemas de aterramento foi publicada em 08.01.2014 e entrou em vigor a partir de 08.02.2014. Atualmente esta norma encontra-se em processo de revisão no âmbito da comissão ABNT/CB-003/CE 003 102 001 (Aterramentos Elétricos).
Como importantes referências para a revisão em curso, podemos citar as normas IEC-62305 e IEEE-80. A norma IEC-62305 é uma norma europeia para Proteção Contra Descargas Atmosféricas (PDA), sendo dividida em 4 partes. Ela remete às características que os materiais a serem utilizados no PDA à norma IEC-62561 (também dividida em partes).
A norma americana IEEE-80 constitui a principal referência para projetos de sistemas de aterramento em subestações adotada em boa parte do mundo e inclusive no Brasil, onde serviu de base para a norma ABNT NBR 15751 – Sistemas de aterramento de subestações – Requisitos. A norma IEEE-80, no que se refere a conexões, remete à norma IEEE-837, que define os requisitos e os ensaios que este material deve cumprir para atender às exigências do projeto e à qualidade e eficiência pelo tempo de vida útil definido para o sistema
A nova ABNT NBR 16254 apresentará uma ampla classificação dos materiais que são utilizados em sistemas de aterramento, estabelecendo as características técnicas que estes materiais devem atender para garantir sua eficiência de operação ao longo do tempo. Os principais materiais utilizados em sistemas de aterramento e abordados pela norma são: condutores, hastes, conexões e tratamento do solo. Os requisitos e ensaios são definidos na norma para cada tipo de material em função da sua composição (cobre puro, aço cobreado, aço zincado etc.). Alguns elementos, como cabo de cobre, por exemplo, já são cobertos por normas específicas e, nestes casos, a ABNT NBR 16254 estabelece que estes materiais devem atender aos requisitos que constam nas normas específicas.
As normas específicas de materiais são, geralmente, normas de fabricação e a revisão da ABNT NBR 16254, além de estabelecer requisitos e ensaios para materiais não cobertos por normas específicas, deverá abordar as informações que são relevantes para os cálculos de projetos do sistema de aterramento como dimensionamento dos materiais, suportabilidade (térmica e mecânica), formas de instalação etc.
Os critérios básicos para escolha dos materiais se pautam em parâmetros elétricos (resistividade e resistência), e são baseados nos princípios da termodinâmica, onde o aquecimento produzido pela passagem de corrente determina a capacidade de condução e a durabilidade do material.
Os aspectos mecânicos também são importantes, sendo que a resistência mecânica do condutor está diretamente ligada aos processos de aquecimento e resfriamento sofridos pelo material ao longo da sua vida útil. As normas acima citadas, assim como a IEC-62305 e a ABNT NBR 5419, apresentam tabelas com as dimensões mínimas recomendadas para materiais a serem utilizados como eletrodos de aterramento, do ponto de vista elétrico e mecânico. Isto significa que, caso o cálculo de algum material resulte em seção menor das que constam na tabela de seções mínimas, deve-se seguir a tabela. No âmbito da revisão da ABNT NBR 16254, os aspectos de seção mínima em algumas aplicações específicas ainda são temas em discussão (como por exemplo contrapesos de linhas de transmissão, aterramentos de redes de distribuição etc.).
A suportabilidade aos esforços térmicos previstos para uma dada aplicação do material está associada ao aquecimento que este material poderá suportar sem sofrer alterações em suas características físicas (elétricas ou mecânicas). O transporte de corrente resultará na elevação da temperatura do material, em função do tempo de duração e da magnitude da corrente transportada. O tempo e a corrente de falta para a terra são definidos em projeto de acordo com o tipo da instalação e com os tempos de atuação das proteções. Quanto maior o tempo de atuação da proteção, maior será a elevação de temperatura dos componentes do aterramento.
As correntes impulsivas, associadas usualmente a quedas de raios, têm duração da ordem de μs, e por este motivo o fator de elevação da temperatura em função da duração do evento não é crítico para definição das seções dos elementos condutores. Outros processos resultam na redução da vida útil dos materiais, tais como sucessivos eventos de aquecimento e resfriamento e a agressividade eletroquímica do solo (associada à corrosão). Porém, considera-se que o estabelecimento de seções mínimas para os condutores resolve estes problemas complementares. Desta forma, tem-se que a elevação máxima de temperatura admissível para a condição de falta para a terra é o parâmetro fundamental para o dimensionamento e especificação do material de aterramento.
A equação de Onderdonk e Sverak (Tabela 1a), constante da IEEE-80, permite o cálculo da capacidade de transporte de corrente de um condutor de determinada seção (S), em função do tempo de aplicação da corrente e de outros parâmetros. Esta equação é utilizada para dimensionamento térmico dos diferentes materiais utilizados em sistemas de aterramento (condutores e conexões). O resultado obtido é conservativo, pois pressupõe que o processo térmico em um elemento condutor submetido a uma elevada corrente é adiabático, ou seja, não envolve troca de calor com o meio. Como vários fatores são constantes para cada material, a equação pode ser simplificada utilizando-se um fator Kf, conforme consta da IEEE-80 (Tabela 1 b).
Estas equações e tabelas com os respectivos parâmetros elétricos e térmicos, constam das normas IEEE-80 e IEEE-837, assim como das normas ABNT NBR 15751, ABNT NBR 16527 e ABNT NBR 16254. A ideia, ainda em discussão no âmbito da revisão da ABNT NBR 16254, é que as equações e as respectivas tabelas de parâmetros constem apenas na norma de materiais, de modo que as demais normas possam referenciá-la.
As Tabelas 2 e 3 apresentam os valores dos parâmetros dos materiais tipicamente utilizados em aterramentos, a seguir relacionados:
- S – seção do condutor (mm²);
- If – valor eficaz (RMS) da corrente de falta fase-terra (kA);
- tc – duração da aplicação da corrente (s);
- Tr – temperatura de referência das constantes do material (em °C);
- Tm – temperatura máxima suportável pelos materiais utilizados (em °C);
- Ta – temperatura ambiente, expressa em graus Celsius (°C);
- ρr – resistividade do condutor de aterramento na temperatura de referência Tr (μΩ.cm);
- αr – coeficiente térmico de resistividade do condutor na temperatura de referência Tr (1/°C);
- K0 =1/α0 ou (1/αr) – coeficiente térmico de condutividade do condutor a 0 °C ou na temperatura de referência Tr;
- TCAP – fator de capacidade térmica por unidade de volume (J/(cm³.°C));
- Kf – constante do material para a expressão simplificada (Tabela 3).
Nota: Os valores apresentados nas equações da tabela 1 são para formas de ondas simétricas. Um fator de decremento deve ser usado para determinar a corrente rms para formas de ondas assimétricas.
Constata-se que os principais parâmetros térmicos constantes das equações para dimensionamento de condutores em sistemas de aterramento são a temperatura de fusão e a capacidade térmica (TCAP – Thermal Cycling Absortion Process). O TCAP é um parâmetro específico do tipo de material do condutor (aço, cobre, aço cobreado, alumínio etc.) e está relacionado à quantidade de energia térmica que o material consegue absorver sem alteração das suas características elétricas e mecânicas. O TCAP exprime a capacidade térmica do material por unidade de volume (em J/(cm3 x oC)), e pode ser calculado a partir do calor específico (em cal/(grama x oC)) e da densidade específica (em gramas/cm3) de cada material.
O projetista tem a liberdade de estabelecer critérios mais rigorosos quando do dimensionamento dos condutores e conexões, se entender necessário, especialmente no que diz respeito à temperatura máxima utilizada no cálculo. Usualmente são feitas as seguintes considerações:
- a partir de 250 ºC o cobre inicia um processo de recozimento e de alteração de suas características mecânicas, sendo esta a temperatura limite, normalmente utilizada para conexões mecânicas;
- uma margem de segurança de 20% com relação à temperatura de fusão do cobre, para os condutores de cobre ou de aço cobreado com conexões permanentes (solda exotérmica ou à compressão), resultando na temperatura limite de 850 °C.
Outras considerações podem interferir neste dimensionamento, como:
- expectativa de esforços mecânicos anormais;
- solos muito agressivos em termos de corrosão;
- tempo de eliminação da falta para a terra que considere a possibilidade de falha da proteção de 1ª linha, e que resulte na atuação da proteção de 2ª linha, com o consequente aumento do tempo de aplicação da corrente.
(a) – para materiais compostos, como aço revestido de cobre, os valores são médios para o condutor, sendo que o fabricante pode definir estes por parâmetros meio de ensaios.
Nota: Fatores calculados para temperatura Ta = 40 °C
(a) – é uma boa prática utilizar o fator Tm com margem de segurança de 20% com relação à temperatura de fusão para os condutores de cobre ou de aço cobreado com conexões permanentes (solda exotérmica ou à compressão), resultando na temperatura limite de 850 °C.
Além da especificação do condutor de forma correta, é imprescindível também especificar uma conexão que garantam todos os requisitos mencionados para o condutor, caso contrário, pode-se colocar em risco todo o projeto, mas isso será assunto para outro artigo.
Autores:
Rinaldo Júnior Botelho é engenheiro eletricista, bacharel em Matemática, MBA em gestão empresarial, membro do COBEI na Comissão de Sistemas de Aterramento, coordenador do Grupo de materiais para aterramento e membro da comissão da ABNT NBR 5419, conselheiro no CIESP Guarulhos, sócio-diretor e responsável técnico da Fastweld Industria e Comércio Ltda.
Paulo Edmundo da Fonseca Freire é engenheiro eletricista e Mestre em Sistemas de Potência (PUC RJ). Doutor em Geociências (UNICAMP) e membro do CIGRE e do COBEI, também atua como diretor da Paiol Engenharia.
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Fonte: www.osetoreletrico.com.br